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Bem-vindos e Bem-vindas!! Saravá!

quinta-feira, 30 de junho de 2011

(Re) Volver

Puxa o gatilho e lá se vai o pensamento.

Movimento retilíneo uniforme, progressivo no tempo, sem rastros no chão, quebrando a barreira do ar. Não há volta.

O pensamento vai, vai, vai - eu não vou.

Assim funciona a memória.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Visão Periférica

. “Está tudo bem, só estou cansado. Minhas ressacas não são mais as mesmas, estou ficando muito velho pra essas noitadas.” Encerrou a conversa assim, se enfiou na cama e dormiu a tarde inteira. E por que ela não acreditava no que ele estava dizendo? Apesar da pouca convivência, sabia bem das suas recaídas e como ficava depois.

Essa era, com certeza, uma delas.

Quando finalmente acordou ela disse que se preocupava. Ele estava prostrado. Ela? Com medo. Mais insegura do que com medo. Logo agora que tinham a chance de estar juntos, planos esquisitos ainda aconteciam. Escorregões que faziam ambos sofrer. Mas como se fazer entender? Não havia mesmo solução. O jeito era ter paciência. Muita paciência.

domingo, 26 de junho de 2011

Beija-flor


Inspirar bem fundo às 5:17 e depois de 8 anos perceber que o sol nasce atrás da coluna do prédio - a beleza não deixa de aparecer. Depois de 8 anos. E depois mais 1 desses muitos se deparar com água do beija-flor que não é trocada há 2. Expirar com o barulho da janela do vizinho acordando com as cortinas acesas pela meia luz sol-lâmpada. O barulho do silêncio mortal inaudível pela infelicidade do ruído das cenas brutalmente cotidianas. Todos os 365 dias para se envolver com o impossível do especial que todos têm.  Ah, se todos os dias fossem degrades amarelo-azuis! Acordar com os pássaros nunca foi privilegio. Acordar com o murro do vento na janela pleno-sol no horário exato do sem-degrade. Sentir o gosto do desjejum; mastigá-lo. Engolir a vida-morte de cada dia. Os dias... os 8 anos menos 2 da água do beija-flor. As tardes mais longas, mais quentes, mais cenas, menos ouvidos às 17:05. Perder longos 6 anos e ter que escolher entre a parede ou a água com açúcar. Adentrar azul a fundo e escutar antes das 6... antes de amanhecer... antes de reparar algo mais.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Nono dia: Décimo dia

Querido diário,

Hoje eu avancei o calendário. Arranquei uma folhinha a mais, bem embaixo do nariz de Jesus. Ele me olhou nos olhos, me apontou seu sagrado coração, mas era mais forte que eu. Ele iria entender. Era só comprar outro, ninguém iria notar.

Hoje marca 16 de Abril de 2011. Então hoje é 16 de Abril de 2011. Dia Nacional da Voz. De "labutar por uma nova realidade social" - diz a folhinha. Amassei o dia 15 sem nem ler. Ele não aconteceu. Ninguém sabe. Só eu.

Hoje eu fiz o mesmo de sempre. O destino estaria radiante se não fossem 16. Burlei o destino.

domingo, 19 de junho de 2011

Creme de Queijo

Passou o dia inteiro tentando encontrar uma receita simples e deliciosa de creme de queijo Neuchâtel . Nunca tinha ouvido falar nesse tipo de laticínio e queria que o resultado fosse perfeito, para comer com os morangos docinhos que haviam comprado.

Era tudo muito fácil, o dia a dia leve, leve.... O creme devia ser tão delicioso quanto o momento que estavam vivendo. Queijo Neuchâtel, creme de leite fresco, açúcar de confeiteiro, morangos bem vermelhos... Simples e delicioso. Tudo o que tinha que fazer era deixar na consistência certa. Não seria assim também com o amor? Achar a ‘consistência’ certa?

O amor fantasia de Vinicius, o amor para além do bem e do mal de Nietzsche... O de Drummond era grande, mas cabia no breve espaço de beijar. E Lennon nos ensinou que é como uma flor, “♫ you got to let it, you got to let it grow ♫”.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Diário de inverno (30/01/76).

Nem sinal do carteiro, e com isso não dá vontade de fazer muita coisa. Lembrei de Elisa: uma tentativa de enamoramento pós-Martinha. Nem preciso mencionar que foi infrutífero; nem por apelido ou diminutivo de nossos nomes conseguíamos nos chamar – era uma sensação constante de desconforto. O irmão de Martinha apareceu um dia para pegar as coisas que ela tinha deixado, e deu de cara com Elisa. Quem sabe não contou pra ela o que viu, ou melhor, quem viu, e assim dificultou nosso reatamento?  Foi isso, só poderia ter sido isso.
As noticias me amedrontam. Decidi parar de ouvir o rádio depois da devastação causada pelo mau tempo. Ao tomar decisões como esta, fico a imaginar se o que procuro não é a vontade de me martirizar com a espera, pois não terei mais nada para fazer – só esperar, esperar, e esperar. Neruda, me salve!

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Oitavo dia: Revólver

O lugar é o mesmo de sempre. Mudou-se o dia. Mudou-se a hora de encontro. Pimba! Mesas na rua, jazz de primeira classe, 2 novos garçons, cerveja quente, até o dono do bar estava de bom humor. Peraí, eu não mudei tanto assim, ou mudei, só de mudar o dia?

Mudei o dia. A lua nasce à tarde, outono é quente, o encontro era amanhã e não hoje. Volto à pé. Dá tempo. Opa! Outro público, público hostil que me manda voltar pra casa por qualquer caminho, até voando. Então talvez eu não tenha mudado tanto assim.

Acordei cedo, tomei banho, tomei café. Ué! Cadê o café? Ontem tinha um pote cheio, não é possível que tenham tomado 10 litros de café em um dia. Como saio de casa sem o café da minha cafeteira? Não mudei NADA.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Vestido Envelope


Assustada demais com a coincidência, não conseguiu deixar de comentar com seu irmão sobre a data que veio na cabeça um dia depois do aniversário do primeiro casamento. Treze de junho de 2004. Foi o exato dia em que tudo começou.

Levantou-se cedo e escolheu a roupa que vestiria para o encontro. Não queria nada muito ousado, mas gostaria que fosse algo elegante que insinuasse suas belas formas. Escolheu um vestido sóbrio, porém decotado e marcando a cintura, do tipo envelope. “Genial a Diane Von Furstenberg, não existe nada mais feminino do que o wrap dress”, pensou alto sobre a estilista que entrou para a história.

Era a primeira vez que sentia-se sedutora. Lembrou-se da propaganda antiga do sutiã e achou que a primeira sedução também nunca é esquecida. Aquele homem seria dela e os dois mudariam seus rumos só porque ela acordou com vontade de ser dona do próprio caminho.

Já era hora de desafiar o mundo e seguir seu próprio coração em busca de satisfação pessoal. Era chegada a hora de tirar as próprias conclusões e sofrer as consequências. Ao final, tinha certeza, o saldo seria positivo.

E acreditava mesmo no que pensava. Pegou a bolsa e, sem nem mesmo passar maquiagem, saiu de casa para o encontro que transformaria a sua vida pelos próximos dez anos.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Diário de inverno


27/12/75
Essa velha dor nas costas. Chegado o inverno é a certeza dessa maldita dor nas costas; de quando em vez a comparo com uma dobradiça enferrujada, tal que um pouco de óleo e umas boas envergadas não fariam mal algum. No entanto me pego pensando nessa analogia, e a acho tão medíocre que logo me ponho a procurar outra – obviamente sem sucesso. Nunca entendi muito bem a vontade resoluta que me dá de procurar outra coisa quando a que eu tenho me serve. Eu chego a argumentar comigo apenas – a altercação normalmente dura pouco; sei que a coisa que possuo é insignificante então tento abocanhar outra de melhor estirpe; o que me incomoda é a deliberação da procura. Ultimamente tem feito bastante frio. Invariavelmente a maleabilidade da coluna se limita a alguns ângulos e a poucos movimentos, como levantar da cama, tomar uma ducha quente – neste momento alivia um pouco a dor –, e voltar para a cama. O frio não tem ajudado muito. Um corpo cálido ajudaria no silêncio gélido do leito. Quem diria qu’eu pensaria assim só por causa da baixa temperatura e da pouca calefação; muitos diriam que estou me enganando com desculpas esfarrapadas devido à solidão, mas nego com toda convicção que não tem nada, mas completamente nada a ver. É só o frio, a janela fechada e a cor bege dessas paredes sem graça. 

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Não estou vendo (1.000 olhos)

"Se conseguir encontrar um gato preto, em um quarto escuro, usando óculos, me diga como"



...


Joga búzios, tira cartas, lê borras de café, ouve pessoas. Sula da Ciranda coloca seu futuro em palavras.

Escreva o nome do seu amado num pedaço de papel e em cima do nome dele escreva o seu. Repita isso por sete vezes no mesmo papel. Depois, coloque em prato e despeje mel por cima. Para outras simpatias, Mãe Marlena.

Sabia que seu signo não diz tudo sobre você? Faça sua carta astral com Maria Lua e entenda como a energia dos planetas e das estrelas te afetam.

Quem semeia nabos, colhe nabos. É como 2 e 2 são 4. Sou seu vô e tenho experiência - além de um diploma em economia.

O diabo se instala onde não há deus. E deus não falha, quem falha são os homens. Para isso, nossa igreja  da luz oferece o caminho para que não se desvie e se feche os olhos para a escuridão.

O último romance de Roman Savon nos permite ter um novo olhar para as nossas relações. Sua delicada descrição da atual sociedade lança uma nova interpretação da sutileza dos nossos gestos para que não deixemos a correria do dia-a-dia passar por cima de nós e de nossas prioridades.

A interferência na sociedade é a pauta do Movimento Revolucionário. Fazemos a diferença com uma ação firme, sempre discutida, que visa uma maior inserção política de grupos minoritários e marginalizados.

Feijão + Música = vida.

Obrigada a todos pelos comentários de feliz aniversário.

Uma racionalização da própria incoerência é uma forma de se colocar no mundo e admitir suas faltas, se ver como ser humano. Analise por palavras, coloque para fora... como mesmo era aquele cachorro no seu sonho?

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Qual a saída?


Experimentava toda a sorte de sentimentos de confusão e abandono quando no auge da briga ele saía de casa e se instalava em um hotel qualquer, voltando para casa muitas vezes dias depois. Chorando. Transtornada, eu quebrava tudo que estava ao meu alcance. Desabando em pranto, dormia soluçando.

O pior era o dia seguinte. Não tinha muito com quem contar que fosse de extrema confiança. Se eu pedisse ajuda iria expor o problema real e ele já havia me deixado claro que aquele era o estilo de vida que queria levar, do contrário não teria se separado para estar comigo. Eu sentia falta da minha família, mas essa opção era absurda. E acabava procurando consolo no colo de amigos e amigas dele – mais tarde alguns se tornariam realmente meus bons amigos.

O relacionamento era claramente um jogo de poder e comecei a ter, com frequência, ondas de tristeza, que me valeram momentos de muito sofrimento, pois era bastante difícil disfarçar. A angústia de me tornar uma pessoa triste me invadia. Entristecida eu não teria mais nenhum valor. E foi quando me deparei com meu segundo maior medo: o de me tornar triste.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Hoje é dia de José e Maria (Capítulo IV)

IV
“Merda!” Foi a primeira expressão de José ao ouvir o despertador, seguida de “por que tenho que ir trabalhar sábado?” mais lamuriosa. Maria Helena o cutuca. Automaticamente ele entende do que se trata: desligar o despertador. Levanta da cama, toma um rápido banho, arruma-se, e sai para o trabalho preferindo pegar o café na padaria para fazer o desjejum no escritório. No elevador da empresa dá de cara com seu chefe. Aproveita a ocasião para comentar sobre a tal viagem.
- Doutor João, ontem estive conversando com Moises, ele comentou sobre ir a Belém...
- Não vai ser mais necessário. Hoje entrei em contato com eles lá em Belém e me informaram que preferem deixar para o segundo semestre. Se estiver disponível em agosto mando você.
- Tá certo. Em agosto fica até...  – Neste instante a porta do elevador abre e José fica por terminar a frase sozinho: “até...melhor”.
Após receber a dispensa da viagem, estranhamente teve vontade de chegar em casa e dizer a sua mulher que iria viajar. Na verdade, o dia foi passando e a vontade se transformou, espantosamente, em decisão. “Falarei que vou viajar... Vou dizer e pronto. “Maria terei de ir a Belém semana que vem, na próxima sexta... Representação da empresa!” E assim foi o dia inteiro, ensaiando o aviso da suposta viagem; a mentira deveria ser perfeita.
Maria em nenhum momento iria perceber que se tratava de uma mentira, afinal, ele de tempos em tempos viajava a trabalho; ao se tratar de uma mentira, vai saber por que ele deveria dar tantos detalhes quanto imaginara dever dar.
 Uma única coisa esboroara da cabeça de José: que rumo tomaria após informar  Maria sobre a viagem? Todavia, ao chega em casa após a faina, antes mesmo de cumprimentar a esposa, larga sua valise na poltrona, joga blazer por cima, dá um longo suspiro artificial e informa: “sexta que vem... Outra viagem”. Maria de pronto diz: “São Paulo de novo amor?”, “Não” responde o marido, e completa após outro suspiro, este mais rápido e de aparência mais sincera: “Agora é Belém.”.