A cidade era pequena - ou a concentração de renda que era mais forte? Havia somente um colégio, dois parques e muitos botequins. Naquele colégio se encontravam as crianças ricas e aquelas pobrinhas que tinham pais preocupados com educação.
Numa dessas pobrinhas, tinha-se uma família que se igualava a um time de futebol: dez em campo e um goleiro. O goleiro tinha suas regras próprias jogando com a mão e se colocando à disposição de todos os chutes: não negamos ser o filho o mais novo. O mais velho, ares de capitão do time, repassando as informações do técnico - eita, telefone sem fio! Os outros, cada qual com sua função para juntos batalharem pelo gol. E quem vence é a equipe: o nome da família na sobrevivência das espécies que, singelamente, chamamos de civilização.
As regras do jogo são óbvias: o homem sustenta a casa, a mulher cria os filhos, a palavra é de ordem e a palmada é autoridade. Seriam mais óbvias não fosse a globalização e os campeonatos estaduais, federais e, quiçá até onde fosse o nome da família poderiam alcançar competições internacionais! Todo esse contato apresentou obstáculos como corrupção, mentira, drogas, fofoca, menosprezo. Algo se perdeu. Quando a equipe toda falha, primeiro trocamos o técnico. Mas ainda bem que no jogo da civilização existe a morte, e é mais fácil superar a morte do técnico que a morte do jogador - lembremos do esquema da responsabilidade civil: mendigos, suicidas e ignorantes são responsabilidade coletiva, todos sofrem.
Mas que algo foi esse perdido? Foi a autoridade? Foi a voz da verdade? Porque não compreendemos que foi a regra do jogo. Quando não são respeitadas, é difícil admitir um caminho alternativo. Tolerância não é muito admitida nesses momentos de escalada social, predação animal é pouco perto dos sentimentos humanos.
Sem fugir muito da família, uma das regras para o controle de tantos jogadores é a palavra. E mais que ela, a imaginação. É por poucas palavras que se permite à imaginação fluir e se criar um mundo no qual se tem domínio..... esse é o sonho de todo técnico - e este ainda se diz técnico, burocrático, científico e objetivo... imagina quando se descobrir um sujeito! Criam-se intrigas internas ao comparar jogadores, a ir contra vontades pessoais. Tudo em nome do coletivo. Coletivo de quem? Do técnico, oras. Ou achamos que técnicos ouvem a torcida?
Pobre do técnico que não explicou o jogo e não conseguiu mais ser ouvido. O mais-velho acreditou ser o capitão do time e, mesmo perdendo o posto com o cartão vermelho, continuou na sua função de picotar a comunicação a seu favor na lateral do campo. O mais novo acreditou ser o goleiro e, depois de alguns frangos no segundo tempo se frustrou e fingiu uma contusão. O atacante passou a jogar na defesa. O lateral esquerdo ensaiou de goleiro.
A última lembrança que se tem dessa metáfora foi quando, após o apito final e a insistência dos jogadores, o técnico furou a bola e se retirou de campo, deixando-os uns contra os outros sem perceberem o fim do jogo.
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